28/07/07

Nocturna

Não sei se espere o novo dia para partir,
Ou se sucumba já às dores do primeiro passo.
É que às vezes as calçadas são tão duras,
E as fraquezas sempre puras de silêncio,
Num chão-ladrilho denso de pedras despegadas.

Talvez aproveite o esvair da aurora,
A bórea real insensível ou as brumas,
Despontadas, imensas, e atire o calcanhar
Deserto de receios ao embate cru da lage lisa,
Fria.

Ou talvez fique, apegado à eternidade do momento,
Apenas dado, apenas lento.
Se calhar, cada dia que passa fica sempre um pouco mais,
E talvez consigamos, parados, ver passar tudo o que interessa.

Não sei se espere, ou fique mesmo, ou parta,
Se chame ou me faça à estrada invisível.
Talvez me deite, atento à hora tardia,
Para que, fechando os olhos às cruéis luzes soturnas,
Consiga chegar cedo, madrugando destemido
Ao nascer do novo dia.

22/07/07

Noite de Verão 2

Talvez fiquemos longe porque juntos não conseguimos, e assim sempre estamos mais perto.

Talvez não falemos, porque a falar dizemos pouco, e preferimos sempre ouvir.

Talvez fiquemos longe porque os abraços foram poucos e breves, cheio daquele medo ansioso de revelar demais de nós.

Preferimos estar longe, porque há uma capa dura e cerrada, que queremos manter, e juntos somos um livro aberto.

Adiamos eternamente o primeiro dos mil beijos que vamos dar, pois não estamos nunca certos de o momento seja certo.

Passou mais um ano, e assim, distantes, fomos ficando à espera – afinal, sempre estamos por perto…

Também eu...

Gostava de conhecer a cura para todas as maleitas e a remissão de todos os pecados,e o segredo de se amar eternamente, da mesma forma, todos os dias.

Gostava de conhecer todas as praias do mundo e o cume de todas as montanhas e todos os caminhos, e as coordenadas da tasca por onde andam o Agostinho e o Pessoa.

Gostava de conhecer uma cápsula que tivesse um vírus que acabasse com gente parva. Depois, gostava de conhecer quem ma pusesse no café.

Gostava de conhecer pessoas felizes.

Gostava de conhecer os insondáveis desígnios do método e da pontualidade, o que seria essencial para justificar cientificamente que chegar atrasado é fundamental.

Gostava de conhecer a mulher perfeita, só por curiosidade.
Gostava de conhecer o meu pai.

Gostava de conhecer quem nem ouvisse o que digo, mas soubesse o que quero dizer, quem percebesse que partir não é deixar pois o que importa vai sempre dentro de nós para todo o lado.

Gostava de conhecer quem amasse por prazer e não por necessidade.
Gostava de conhecer quem precisasse do prazer e não do amor.

Gostava de conhecer quem, sem nunca me ter conhecido, me soubesse reconhecer.

Gostava de conhecer quem soubesse apenas ser.