04/09/07

Dia e noite de Setembro

Sereno, sereno, neste dia e noite de Setembro - não me sai da cabeça o “Chovendo na Roseira”, do meu caro Tom Jobim:

Olha,
está chovendo na roseira…


Digo hoje, embora seja já amanhã, mas só porque se decidiu assim: penso que cada dia só devia acabar quando sentimos que é outro dia…
O meu "Winword" não reconhecia a palavra “Jobim”: serei o único a achar que estes americanos são um bocado parvos? Já para não falar dos congéneres lusófonos que arquitectaram o dicionário anexo em português… adicionei "Jobim" ao Dicionário do meu "Winword". Aproveitei também para adicionar “Winword”, nem me dei ao trabalho de ver se ele reconhecia “Microsoft Word”. Pois… sim, isso já reconhece.

Que só dá rosa,
mas não cheira


Hmmm, aquele gostinho mixolídio da melodia… claro que é pretensiosa, esta coisa da análise musical: ninguém precisa de saber que é uma melodia mixolídia. Nos dias de hoje, pretensiosismo e ignorância andam de mãos dadas… por isso, também adicionei “mixolídio” ao dicionário do Winword. Microlítico existia… suponho que ser-se microlítico é mais importante do que ser-se mixolídio…

Olha,
um Tico-tico mora ao lado


É engraçado, como a pretensão de sentido nas coisas pode determinar a nossa importância histórica e social: se dissermos coisas aparentemente sem sentido, somos parvos. Mas, se por um acaso, alguém se dedicar a procurar um sentido nelas, então somos filósofos, ou poetas. Se muitos alguéns fizerem isso somos génios! Provavelmente, há muitos génios desconhecidos só porque ninguém se deu ao trabalho de lhes procurar um sentido…

Olha,
o jasmineiro está florindo

Também haverão muitos parvos, com muitas teses a eles dedicadas… (adicionei “jasmineiro”. Fiquei feliz por saber que existia “jaspe-negro”!)
Quando a música passa a menor, há uma descida cromática deliciosa… mas claro, cromatismo soa mesmo a coisa de cromo… duvido que ajude se eu acrescentar que o cromatismo é, na música, a mesma coisa que subir ou descer uma escada sem saltar degraus…
Se eu disser “Há coisas boas que me fazem sentir mal” ou “Um dia só termina quando o novo dia começa”, posso estar a um passo de ser filósofo, ou poeta, ou génio… mas provavelmente, estou apenas a ser parvo – o que é algo muito normal, e totalmente desprovido de pretensiosismo…

Olha,
que chuva boa, prazenteira

Acho que a minha versão favorita é a gravada pelo Edu Lobo e pelo próprio Tom Jobim, no álbum “Edu & Tom”… o facto de também poder ser “Tom e Edu”, pois ambas as designações aparecem na capa, cria aqui uma certa ambiguidade. Ficamos confusos: o disco era do Edu, que convidou o Tom a dar uma ajuda. Mas a coisa foi correndo, e o Tom foi ficando… e passou a ser dos dois. O Tom já era o Tom, e o Edu ainda era o Edu… depois, parece que o Tom, quando tomava uns copos, era um bocado chato. Além de teimoso.

Que vem molha … um, dois, três, um, dois, três
minha rosei … um, dois, três, um, dois, três

Ficamos, além de confusos, um pouco parvos, com a humildade destes tipos geniais… hmmm… sabe tão bem, este ternário, que cheira tanto a bossa – e toda a gente, arriscadamente pretensiosa, sabe que a bossa é quaternária – "ou sexagenária!", diria alguém cativo ao espírito da piada fácil… “Ah, ah….” – um gajo tinha de se rir, para não se armar em cromo… e depois pensava “Fosga-se… há com cada tanso…”. O “Word” não corrige “há com cada tanso”… deve estar certo.

E o riachinho de água esperta,
Se lança em vasto rio de águas calmas


Adicionei “riachinho”. Existia “riachozinho”, mas acho que o Tom Jobim é um lusófono bem mais genial e entendido nestas coisas do que os parvos que arquitectaram o dicionário do “Word”.

Hmmm, sereno, sereno, neste dia e noite de Setembro… ainda deve ser ontem, parece mesmo que oiço o Edu…

Aahhh, você é de ninguém…
Aahhh, você é de ninguém…
Aaahhhh, você é de ninguém…