25/10/14

Buenos Aires

É preciso que morra um anjo,
que as estações do teu porto
se multipliquem por mil
ou que morram
velhos abuelitos
tropeçando num último tango
de oblívio
libertino.

Buenos Aires
Quando volto a ver-te?

24/01/14

Quem entendesse na língua das aves

Choraste no meu ombro
como uma criança nua.
Era o amor, dizias.
Um amor a partir,
ou já ido.
De ti, sabias agora pouco;
e do amor, nada sabias.
Da janela via-se a tarde,
a rua cinzenta e mansa
e a tua voz imensa, soluçada.
Dei-te o meu ombro
como dá a praia colo
onde a onda se parta
areia vítrea,
onde a raiva se escorre
fundida, sangrada.
Ah, quem entendesse
na língua das aves
palavras verdes
esperança
e estendesse o desamor
à desolação da temperança:
o beijo é um sopro
se o lábio se aparta.


21/01/14

Prece a Morfeu

Assim como veio,
foi-se Morfeu.
E com ele,
o branco halo que embalava
o meu corpo já livre,
em ascensão.

Foi-se afugentado
a ruídos de cidade,
murmúrio das gentes e
gritos capitais;
noutros sonhos
há o rente crepitar da mágoa
e um rio sereno
de tentação.

E agora, Morfeu?
Quem me salva das palavras
que ferem tanto
e do ranger destas mãos
de ébano tibiado
cheias de ausência?

Volta, volta!
Lança-me o teu manto,
Morfeu,
negro como aquele olhar
de colo deserto,
sombrio como a frágua.
Morto o corpo
deitado, preso de mente,
deixado hoje, só.
Amanhã, teu.