25/05/08

Tardio

Passavas, passavas,
E eu sabia que fugias.
Dizias, dizias,
E eu sabia que cantavas.
E ias, e ias.
E eu sabia que ficavas.

E chamavas,
E eu fingia que ouvia.
E amavas,
E eu achava que sentia.

E paravas, paravas.
E eu sabia que descia.

E então fui.
Mas já cá não estavas.

02/05/08

Credo

Não sei se bem, mas chamam-me Profeta. O que vê, não só as coisas imediatas, as interpreta e transmite, mas as outras, as futuras, as indizíveis. O Profeta, o Conselheiro magistral dos presságios divinos, o vaticinador das bem-aventuranças, eufemizador da doença e da morte, refúgio derradeiro das incertezas e dos medos!

Profeta - professor: não dos que professoram, mas que professam, não dos doutores, mas dos doutos. Que há para ensinar, senão a profissão de si?

Professor - Profeta. Não que vê, mas faz olhar.

Profeta, chamam-me. Um Profissional da Profecia, um aleivoso marginal da confiança alheia - menos difícil que a confiança do próprio -, um visionário camuflado de humilde, o detentor do momento apocalíptico feito credo, feito cruz, profecia-luz, divina.

Pro-fe-ta, Pro-fe-ssor, A-divinare, Divina, que os celestes mais não são que apenas prophéte-izados, Pro-fi-ssionais, caminho único das catorze estações.

Mas não! Não sou pro em nada, nem pheta, nem fessione, não sou fide-digno; antes tépido e pérfido, como quem pro-fe-ssa o que não sente, pro-fe-tiza o que não viu, sem o que de comum há em toda a profissão, profecia, professorado saber.

Agora, sou apenas um comum, paradoxal commune, os que, em conjunto, são alheios ao resto no crédito, na pro-phe-tia.

Agora, sou apenas um disjunto, um homem sem fé.